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quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

O CALCANHAR DO SISTEMA

Por Amauri Meireles*

As recentes ameaças à sociedade carioca (incêndio de veículos, bloqueios de vias, pilhagens via-arrastões, ataques a órgãos de segurança) retratam a fragilidade do sistema de administração prisional brasileiro: ordens, de chefes para braçais do tráfico, teriam partido de presídios de segurança máxima; marginais, travestidos de advogados, aproveitando-se de circunstâncias favoráveis na legislação penal (contato direto com presos, recebimento de correspondência, inexistência de revistas pessoais) teriam sido os mensageiros; outra hipótese seria quando da visita de familiares e as íntimas; minimamente, a entrada de celulares e drogas em estabelecimentos penais parece uma infindável brincadeira de gato e rato; rastreamento eletrônico, bloqueadores de comunicações ainda não mostraram eficácia; enfim, falta doutrina para a atividade. E a videoconferência, sem unanimidade, não vem sendo utilizada. Os apressados culpam os agentes prisionais: “incompetentes e corruptos”. Fora uma minoria que envergonha a classe (como há em todas as profissões), quase a totalidade é integrada por homens e mulheres honestos, interessados, prestativos e eficazes, cuja atividade, pela Organização Mundial de Saúde, é considerada uma das mais estressantes no mundo.

A desinformação tem gerado conclusões apressadas e inconseqüentes, pois, a fragilidade do sistema de administração prisional tem origem fora dos estabelecimentos penais: modelo de gestão e legislação.

Os presídios federais caminham para se tornarem órgãos-modelo: agentes de ótimo gabarito, concursados, treinados, bem remunerados, recursos tecnológicos na administração e na logística, instalações vitais muito bem concebidas e protegidas, trabalho primoroso, etc. Porém, nos estabelecimentos estaduais, o caos ainda não se estabeleceu exatamente em razão do trabalho dos agentes prisionais. Quem é do ramo sabe, são eles que, efetivamente, “seguram a cadeia”.

O sistema de administração penal é o aquiliano calcanhar no sistema de salvaguarda social (segurança pública), integrante do sistema de defesa social: pelo equivocado estigma gerador de desatenção estatal; pela gestão inadequada; por falta de profissionalização da atividade (deveres e garantias estão indefinidos; inexistência de plano de carreira; as diretorias de estabelecimentos penais, em maioria, são transformadas em sinecuras, ocupadas por apaniguados); por não se investir no profissionalismo (indicações da parcela do poder/força a ser exercido pelo pessoal envolvido); pela estrutura obsoleta (por exemplo, inexiste órgão institucionalizado de inteligência policial prisional); pelo arremedo de ressocialização. Então, por que não se corrige essa distorção se, inexoravelmente, o preso vai pra lá? Por miopia política!

No Congresso, está para ser votada e promulgada a PEC-308, que reconhece normativamente a Polícia Penal, que já existe de fato. Uma análise isenta de custo/benefício irá constatar que o Brasil está atrasado nesse quesito, ao contrário de outros países que já estruturaram essa polícia. Entretanto, os estreitos de visão enxergam a PEC como um pleito classista e não um avanço na proteção social; ela é esconjurada pelos adeptos da terceirização, que não ocorrerá, na atividade-fim, se se reconhecer que a custódia de presos é feita embasada no poder de polícia.

Enfim, é o interesse de alguns se sobrepondo ao interesse social. Até quando?!...


* Amauri Meireles Coronel PM MG
Ex-Comandante da Região Metropolitana de BH
Ex-Superintendente da Guarda Prisional de MG

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